INAC indica que as províncias da Lunda-Norte, Benguela e Luanda lideram a lista de casos de crianças acusadas de feitiçaria. Pelo menos, oito províncias não registaram qualquer caso em 2024.
Por: Diniz Kapapelo*
Pelo menos 100 crianças foram acusadas de prática de feitiçaria em 10 das 18 províncias existentes até 2024. Ao contrário de outros casos, desta vez, Luanda, com 17 casos, foi ultrapassada na estatística do Instituto Nacional da Criança (INAC) por Lunda-Norte, com 30 casos, e Benguela, com 27, sendo estas três, as únicas províncias com a cifra maior de 10 casos registados no ano passado.
Se por um lado há três províncias na liderança, sete registaram menos de 10 casos, nomeadamente, Uíge (8), Zaire (7), Cabinda (4), Malanje (3), Kuanza-Sul (2), Bengo e Huambo com 1 caso cada.
Embora seja difícil saber exactamente quantas crianças são abandonadas, espancadas ou mortas devido à crença ao feiticismo, situação profundamente enraizada em Angola, sobretudo em algumas regiões mais tradicionalistas, principalmente as províncias fronteiriças com a República Democrática do Congo (RDC), outro país onde estas práticas são evidentes, Angola regista casos de sucesso ao ter algumas províncias que não registaram qualquer caso dessa natureza.

Oito províncias sem registo de casos
De acordo com os dados estatísticos do INAC, em 2024, pelo menos oito províncias saíram da ‘lista negra’, o que para muitas organizações da sociedade civil e alguns organismos do Estado que lutam pelo direito das crianças, como o Lar Kuzola e o próprio Instituto Nacional da Criança é um grande ganho.
As províncias que não registaram qualquer caso dessa natureza são as do Bié, Cuando Cubango, Kuanza-Norte, Cunene, Huíla, Lunda-Sul, Moxico e Namibe.

Sociólogo apresenta possíveis causas dessa prática
Para o sociólogo Alberto Nguluve, em muitas realidades, as acusações de feitiçaria resultam da crença à forças sobrenaturais capazes de se impor às pessoas. Neste sentido o agir de um indivíduo pode não traduzir o que de facto é, mas sim o que tais forças determinam.
“Acusa-se uma criança, pois se entende que nela pode agir tais forças ocultas. Acusar uma criança de feitiçaria denota uma certa incapacidade na compreensão do problema em causa e limitações racionais”, explica.
Por outro lado, o especialista avança que há também crianças acusadas da prática de feitiçaria pelo facto de haver religiões ou instituições que reforçam tais práticas pois elas reflectem uma sociedade, vice-versa.
“Quanto maior for a crença na força sobrenatural, maior é a probabilidade de práticas de fetiçaria”, adverte, acrescentando que nas regiões onde a educação tem menor incidência, mas uma presença maior de práticas tradicionais fundamentadas em mitos ou crenças ao sobrenatural, maior tende a ser o número de casos de práticas ligadas a feitiçaria.
Neste sentido, sublinha, o Estado pode contribuir para a superação destas práticas dando maior investimento na educação (desenvolvimento da capacidade cognitiva dos indivíduos) e, de forma geral, desenvolver as condições de vida.
“Também pode, através de leis, normativos e etc, criar mecanismos que impendem tais práticas em Angola”, sustenta.
Importa referir que a lista de casos de violência contra a criança de 2024 contemplaram outros itens como a fug a paternidade que liderou as estatísticas com 13.725 casos, seguido de exploração de trabalho infantil (7.108), violência física (2.595), violência sexual (1.510), bem como violência psicológica (1.192).

Nem os pais poupam os filhos
Muitos casos de crianças acusadas de feitiçaria ocorrem no seio familiar. Foi o que aconteceu com três crianças agredidas e acusadas pela própria mãe no município do Cazenga, em Luanda, em Outubro de 2024.
De acordo com a denúncia recebida pelo INAC, as agressões e as acusações de feitiçaria eram perpetradas pela própria mãe das crianças de 3, 8 e 12 anos.
“A mãe espancava com frequência os três filhos menores e usava uma faca para ameaçá-las de morte”, explicou o director do INAC, Paulo Kalesi.
Segundo o responsável, o caso, que chegou a ser amplamente divulgado na imprensa, foi encaminhado para o Gabinete Municipal da Acção Social e orientado para o Comando Municipal da Polícia Nacional.
Entretanto, em 2022, o INAC recebeu 62 denúncias desta natureza.
Em 2023, o número subiu para 114 e em 2024 o número baixou para 100 casos.