A lista de convidados de Trump: Estratégia política ou apenas mais um espetáculo?

Na segunda-feira, 20 de Janeiro, Donald Trump tomou posse novamente como presidente dos Estados Unidos. Como já é característico do republicano, algumas tradições deverão ser quebradas. Normalmente, em cerimónias de tomada de posse presidencial nos EUA, chefes de Estado e de Governo de outros países não são convidados, sendo os seus respetivos países representados por diplomatas ou ministros dos Negócios Estrangeiros. No entanto, para a posse de Trump, foram convidadas algumas das mais proeminentes figuras da extrema-direita mundial.

Entre os convidados estão André Ventura, presidente do partido Chega, de Portugal; Santiago Abascal, líder do Vox, de Espanha, e presidente do grupo Patriotas pela Europa, no Parlamento Europeu; Éric Zemmour, do partido francês de extrema-direita Reconquête; Tom van Grieken, do Vlaams Belang, da Bélgica; Nigel Farage, do Reino Unido; e Alice Weidel, do partido alemão Alternative für Deutschland (AfD), que será representado pelo vice-líder Tino Chrupalla.

Além destas lideranças, estarão também presentes o presidente da Argentina, Javier Milei, e a primeira-ministra de Itália, Giorgia Meloni.

Já o ex-presidente brasileiro Jair Bolsonaro, embora tenha sido convidado, não poderá comparecer devido à apreensão do seu passaporte pela Justiça brasileira, em virtude de investigações em curso.

À primeira vista, a lista de convidados pode parecer uma tentativa de construir uma aliança populista transnacional de extrema-direita. No entanto, a realidade é bem menos grandiosa do que sugere a encenação. A escolha não é apenas uma demonstração de afinidade ideológica, nem significa que esses líderes, por mais que utilizem o convite como peça de propaganda para se apresentarem como figuras influentes, trarão qualquer benefício real para as suas economias caso cheguem ao poder.

Na prática, Trump já demonstrou que as suas alianças são voláteis e que a afinidade política não se traduz em privilégios. Boris Johnson, por exemplo, apesar da sintonia com Trump, não conseguiu assegurar um acordo comercial entre o Reino Unido e os EUA. Já Jair Bolsonaro, que se apresentava como aliado incondicional de Washington, viu Trump retribuir o entusiasmo com um aumento das tarifas sobre o aço e o alumínio brasileiros. Por outras palavras, paparicar Trump pode render belas fotografias e manchetes para consumo interno, mas, quando se trata de interesses concretos, a realidade tende a ser bem menos generosa.

Portanto, ao elaborar meticulosamente uma lista de convidados repleta de radicais de direita, quais são, de facto, os objetivos de Trump? Mais do que simplesmente reafirmar o seu alinhamento com figuras que partilham a sua retórica nacionalista, o seu cepticismo em relação à globalização e a sua obsessão anti-imigração, haverá uma estratégia mais profunda por detrás deste movimento? A verdade é que Trump raramente faz algo sem um propósito claro – e, neste caso, a mensagem é evidente: criar a ilusão de uma frente unificada, mesmo que, na prática, cada um destes líderes esteja mais preocupado com a sua própria sobrevivência política do que com qualquer aliança real.

Com a sua tomada de posse, Trump procura demonstrar o seu desprezo pelas elites políticas tradicionais, enquanto envia uma mensagem clara à sua base. E qual é essa mensagem? Não se trata apenas de se posicionar contra o chamado “establishment globalista” e defender uma ordem iliberal, mas de afirmar que ele lidera e exporta essa visão do mundo.

Ao convidar figuras controversas, Trump não só provoca os seus adversários políticos – a quem acusa de perseguição e ataques -, como também desafia as normas diplomáticas tradicionais. Um exemplo claro desta ruptura é a sua recente decisão de solicitar a saída de três diplomatas de carreira do Departamento de Estado: Dereck Hogan, Marcia Bernicat e Alaina Teplitz.

Em administrações anteriores, a continuidade diplomática era assegurada pela presença de profissionais experientes, garantindo uma transição estável e a salvaguarda dos interesses estratégicos dos EUA. Trump, contudo, rompe com essa prática ao substituir diplomatas qualificados por aliados políticos alinhados à sua visão. Esta substituição revela uma tentativa deliberada de moldar a política externa norte-americana de acordo com os seus interesses pessoais e ideológicos, centralizando as decisões e enfraquecendo a influência de especialistas que poderiam servir de contraponto à sua abordagem.

A presença de figuras tão controversas e polarizadoras na posse de Trump vai além de um simples gesto de afinidade ideológica; trata-se de um elemento central da sua estratégia de comunicação. Garantir uma ampla cobertura mediática internacional é, sem dúvida, um dos principais objetivos deste movimento, permitindo a Trump consolidar-se como um líder que rompe com as convenções e desafia o establishment global.

Ao atrair a atenção da imprensa, Trump mantém a sua influência no centro do debate público, projetando-se como a figura que define a agenda política — seja através de elogios ou críticas. Esta exposição contínua, frequentemente impulsionada por controvérsias cuidadosamente calculadas, tem sido uma peça-chave na sua trajetória política. Assim, Trump não só consolida o seu domínio sobre o ciclo noticioso, como também amplia o seu alcance, impactando tanto os seus apoiantes como os seus críticos.

Em última análise, a tomada de posse de Trump não é apenas um evento protocolar, mas uma plataforma cuidadosamente orquestrada para reforçar a sua narrativa política e manter-se no centro das atenções globais. Ou seja, trata-se da transformação de uma cerimónia institucional num espetáculo de autopromoção e provocação. A presença de extremistas de vários países não passa de uma tentativa de alimentar a sua narrativa populista e de manter o controlo do ciclo noticioso, reforçando a ideia de uma aliança global que, na prática, até agora não se traduziu em ganhos concretos. No final, permanece a dúvida: esta encenação política terá um impacto real e duradouro ou será apenas mais um espetáculo efémero destinado a alimentar a sua base e inflamar o debate público?

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