O Presidente cessante dos Estados Unidos, Joe Biden, pronunciou ontem o seu discurso de despedidas, a poucos dias da tomada de posse do seu sucessor, Donald Trump, que regressa à Casa Branca após quatro anos de interregno. O tom de Biden foi sombrio, o dirigente democrata tendo tecido advertências sobre o surgimento de uma “oligarquia” que ele considera “perigosa para a democracia” americana.
Por: Liliana Henriques*
“O nosso sistema de separação e equilíbrio de poderes pode não ser perfeito, mas preservou a nossa democracia por quase 250 anos, mais do que em qualquer outra nação”, disse Joe Biden ao alertar contra um “complexo industrial e tecnológico” que leva a uma “avalanche de falsas informação e desinformação, permitindo o abuso de poder”.
“A imprensa livre está em colapso. Pilares desaparecem. As redes sociais abandonam a verificação dos factos (“fact-checking”)”, lamentou o Presidente cessante. Sem nunca mencionar directamente os nomes dos responsáveis visados, nomeadamente o do magnata das tecnologias Elon Musk, que vai ter um cargo activo na administração Trump, ou o de Mark Zuckerberg, patrão do grupo Meta que anunciou na semana passada que vai deixar de lutar contra as “fake news” na rede Facebook, Joe Biden considerou que os bilionários do mundo da tecnologia adquiriram “uma concentração perigosa de poder”.
“Hoje, uma oligarquia está a formar-se na América. Uma oligarquia de privilégios extremos, poder e influência que ameaça verdadeiramente a nossa democracia, os nossos direitos fundamentais, a nossa liberdade e uma oportunidade justa para todos”, disse Joe Biden numa comunicação a partir do Salão Oval da Casa Branca.
O Presidente democrata também preveniu os seus concidadãos contra os perigos da inteligência artificial, sublinhando que era necessário controlar o que ele chamou de tecnologia “mais importante do nosso tempo, talvez de todos os tempos”.
Um legado frágil
Joe Biden despede-se da presidência da República numa altura em que o seu partido bastante dividido nomeadamente devido ao seu apoio incondicional a Israel na sua guerra em Gaza, também viu a sua influência diminuir a nível nacional, com as principais instituições do poder a caírem nas mãos do partido de Donald Trump, os Republicanos.
Apesar de deixar ao seu sucessor uma economia americana recuperada depois da crise do covid-19 e apesar de estar na origem de um vasto plano de investimento nas infraestruturas do país no sentido de dar um impulso ao emprego no país, Joe Biden não terá conseguido fazer esquecer aos americanos que o seu mandato coincidiu com um aumento substancial do custo de vida.
Muitas das medidas adoptadas durante os quatro anos em que se manteve no poder, designadamente no que tange ao combate às alterações climáticas ou à luta contra as desigualdades sociais, deveriam ser colocadas em causa pela administração de Donald Trump que prometeu desfazer grande parte do que Biden fez.
Daí que muitos dos decretos que Biden tem estado a assinar antes de partir possam apenas ser decisões provisórias. Tal é o caso por exemplo da sua decisão formalizada na terça-feira de retirar Cuba da sua lista de países que apoiam o terrorismo. Em virtude desta decisão, foram aliviadas as sanções americanas contra ilha comunista e Cuba anunciou hoje a libertação de 20 dos 553 presos políticos que se comprometeu a soltar ao abrigo deste dispositivo.
Contudo, ainda ontem Marco Rubio, filho de imigrantes cubanos e futuro Secretário de Estado da administração Trump, sugeriu que vai voltar atrás na decisão de Biden. Ao alegar que o regime cubano mantém bases de espionagem e que foi abertamente “amigável” com grupo como o Hamas e o Hezbollah, o chefe da diplomacia americana considerou que a ilha deve permanecer na lista de países que patrocinam o terrorismo. Rubio também já garantiu que retiraria as sanções aplicadas pela administração democrata contra os extremistas israelitas.
*RFI