Dizia o português Rui Almeida, conceituadíssimo narrador de futebol, olhando para o desempenho dos Palancas Negras no CAN 2023, que Angola chegou aos quartos de final também porque Pedro Gonçalves, o treinador da selecção, foi capaz de ajustar o perfil dos jogadores a determinadas posições. E de facto funcionou. Ou seja, não é o jogador que deve se ajustar à táctica do treinador. Mas cabe ao treinador estudar bem o perfil, as valências técnicas e táticas do jogador, e colocá-lo onde, de acordo com as tais valências, o jogador renderia mais. Isso aconteceu muito bem com Eddie Afonso, como vimos com Fábio Coentrão no Benfica de Jorge de Jesus.
Por: Rui Kandove*
A ilustração do futebol pode perfeitamente se encaixar a política, mais concretaram na acção governativa.
Com o contexto completamente alterado (desfavorável ao MPLA), não faz sentido insistir numa equipa com o rendimento abaixo do medíocre. Quando analisamos a prestação do MPLA nos quatro pleitos eleitorais, consegue-se perceber que há uma espécie de declínio ou, se quisermos, diminuição de votos de 2008 (81,76%), 2012 (62,77%), 2017 (61,05), e 2022 (51,07%).
Qual é a leitura? Lógico que o contexto está completamente alterado. O perfil do maior grupo de eleitores é substancialmente diferente dos anos anteriores. Desde logo, o acesso a informação, o nível de instrução, a expectativa da empregabilidade são elementos que forçam uma abordagem menos tolerante em relação à acção governativa. Ora, num cenário como esse, manter as mesmas figuras do front office ou do primeiro contacto, revela-se fatal para as pretenções do partido.
INOVAR FAZ-SE NECESSÁRIO
O MPLA, partido no poder desde o ano de 1975, nas últimas eleições viu a sua hegemonia estremecida não por outra razão que não seja a sua estratégia algo anacrónica.
A política exige mudanças entre os actores políticos e discursos.
A retorica e as pessoas que integraram a “Task Force” para as eleições de 2022, fez o possível.
Todavia, no plano político e da realidade social, os resultados deste trabalho só vieram demonstrar que o possível esteve aquém de trazer soluções para a governação:
1. Elevado custo de vida;
2. Morte lenta do empresariado;
3. Fuga de investidores estrangeiros;
4. Desinvestimento no sector de petróleo;
5. Elevado número de crianças na rua e a comer no lixo;
6. Política de combate à corrupção tímida (sim porque os sinais exteriores de riqueza se mantêm).
Ora, os exemplos inumeráveis são a prova da grande falha na leitura contextual dos pensadores políticos do partido no poder.
Quando uma determinada equipa, mobilizada para um determinado contexto ou desafio, no caso político, não resulta deve ser repensada a sua continuidade em termos de gestão de processos e responsabilidades.
É preciso inovar, em cada contexto e perante cada resultado, pois, isso sim, seria corrigir o que está mal e melhorar o que está bem. Alias, diria mesmo, estamos algo distante de um indicador razoavelmente aceitável.
Na Europa, se um determinado político ou partido der mostras de incapacidade, exige-se sempre (por iniciativa própria ou pressão externa) mudanças de actores políticos.
Em Angola, ao nível do Governo Central e do partido no poder, é preciso inovar para que outros políticos possam mostrar as suas valências.
Algo de relevante e de repensar seria, desde áreas chaves da cúpula do partido à estrutura da Presidência, fazer-se mudanças.
A preparação do time e da estratégia para 2027, certamente, já devia ter começado. O MPLA só vai ganhar as próximas eleições se repensar o seu Bureau Político e/ou “empoderar“ os Comités Provinciais.
Tal como o futebolista, o político tem uma missão circunstancial, não faz sentido manter um jogador na mesma posição sabendo que está em baixo de forma. Menos sentido faz ainda manter um jogador desiquilabrador no banco por conta de um lapso. O super lateral-esquerdo Roberto Carlos, a altura o melhor do mundo naquela posição, foi substituído por jovem de 18 anos de nome Marcelo, o resto da história é do domínio público. Portanto, é tempo de inovar e se fazer as substituições que se impõe. A nação nunca se esquecerá das medidas corajosas, porém vitais.