O académico e político angolano Nelson Pestana disse hoje, em Luanda, que o MPLA, partido no poder, estará a “bloquear” no parlamento a não aprovação da lei da implementação das autarquias, por “medo de perder a hegemonia” do poder.
“Há um claro bloqueio a nível da Assembleia Nacional para que não se aprove a única lei que falta. O pacote é constituído por 11 leis e a última lei, chamada lei da implementação das autarquias locais, está engavetada por vontade do MPLA”, afirmou hoje o académico Nelson Pestana “Bonavena”, na Conferência sobre o Poder Local em Angola.
A temática sobre a implementação das autarquias em Angola, cuja derradeira lei do pacote legislativo autárquico ainda não foi aprovada pela Assembleia Nacional (parlamento), esteve em discussão hoje na conferência, em Luanda.
Nelson Pestana Bonavena, dirigente do Bloco Democrático e académico angolano, foi um dos oradores do encontro, afirmando não acreditar que exista vontade do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA, no poder desde 1975) na implementação das autarquias em Angola.
“Eu não acredito neste poder, porque o poder (MPLA) vive uma contradição nos seus próprios termos, o poder não quer perder monopólio e a hegemonia do poder”, disse Bonavena à margem da conferência.
Para o docente universitário, as autarquias, pela sua natureza, constituem uma forma de repartição do poder e, observou, para evitar repartir o poder, o MPLA procura “a todo o custo” adiar as autarquias.
“Não é possível o partido no poder ganhar em todos os municípios e, como não é possível isso, ele quer evitar essa distribuição do poder e vai tentando ao máximo adiar essas autarquias”, disse.
O orador da conferência sobre o Poder Local, promovida pela associação cívica Handeka, disse também acreditar que a pressão sobre o MPLA para a implementação das autarquias, a nível da sociedade civil e de partidos na oposição, deve continuar a subir.
A pressão “é cada vez maior e vai continuar a subir e, por isso, ele [o MPLA] há de chegar a um ponto que vai ter de ceder, a não ser que leve as coisas até à revolução”, realçou.
Para o académico, as autarquias também são uma forma de satisfação das reivindicações que estão no espaço público local: “Porque hoje vivemos uma realidade em que a sociedade civil aborda as questões locais que deve continuar a reivindicar”.
Questionado pela Lusa sobre as suas expectativas em torno do segundo ano parlamentar da presente legislatura (2023-2027), que se inicia em 15 de Outubro, Nelson Pestana Bonavena pediu “pressão” à oposição em torno da conclusão do pacote autárquico.
“É pressionar ao máximo ao nível do Parlamento, no sentido de fazer a aprovação da lei e depois pressionar o Presidente da República para convocar as eleições autárquicas. Por isso, 2024 vai ser efetivamente mais um ano de muito combate a favor da realização das autarquias”, atirou.
A jurista Margareth Nangacovie, também uma das oradoras da conferência, falou sobre o Direito à Participação e as Autarquias manifestando-se cética quanto à concretização das primeiras eleições autárquicas em Angola em 2024, mas admitindo, contudo, que haverá algum “sinal” do MPLA: “Acho que o MPLA não sobrevive mais adiando as eleições autárquicas”.
“Penso que o MPLA começa a perceber que não tem mais condições para adiar, mas penso que não vai ser no próximo ano. Talvez aí comecemos a vislumbrar um quadro mais realista sobre quando é que elas comecem a se realizar, mas ainda sou cética”, frisou.
De acordo ainda com a jurista angolana, a experiência participativa dos cidadãos em Angola “está muito viciada pelo processo de partidarização da vida social, das instituições”.
“Precisamos de reconstruir esse conceito na nossa própria vida, nas nossas próprias dinâmicas e resgatar os valores essenciais para o nosso engajamento colectivo”, rematou a também docente universitária.
Fonte: Lusa