Depois de já ter feito parte de duas obras literárias com outros autores, o escritor, analista e académico Alcides Piedoso Ferreira Chivangu apresentou, recentemente, a sua obra literária e científica a solo.
Diniz Kapapelo
Com um título bastante sugestivo para os psicólogos e que pode ser algo intrigante e criar também alguma curiosidade aos juristas e advogados, “O psicólogo como mediador de conflitos nas organizações” vem quebrar, se quisermos ser um pouco ‘contundentes’, o paradigma, segundo o qual, só os advogados e juristas podem ser os mediadores de conflitos como tem sido apanágio na nossa sociedade.
Alcides Chivangu, bastante interventivo em programas radiofónicos e televisivos em Angola com um curriculum de se encher os olhos, garante que traz essa nova roupagem da mediação com o objectivo de promover uma saúde mental nas organizações, senão mesmo, promover uma cultura organizacional assertiva.
E diz o porquê dessa sua analogia: “Nós nascemos numa organização: a família. Desenvolvemos numa organização: a escola e a igreja. E desempenhamos as nossas funções numa organização: as empresas. Sem esquecer que vamos morrer também numa organização que é o cemitério”.
Neste contexto, não tem dúvidas de que se vivemos numa organização, claro que ali vai existir conflitos e serão mesmo inevitáveis em função dos interesses.
Ainda assim, apresenta no seu livro uma fórmula de como viver com esses conflitos: “Devemos ter uma inteligência emocional e ter uma espécie de contrato no sentido de sabermos como é que se vive nas organizações”, garante, sublinhando que, um dos elementos que traz no livro é que, “para vivermos saudavelmente, é necessário saber ouvir o outro. Que é a comunicação assertiva. O outro elemento é que nas organizações existem líderes. Precisamos liderar os outros. Liderar não é ser Chefe. Liderar é influenciar para que os outros cumpram os seus objectivos porque as organizações têm objectivos”.
Na sua perspectiva, até na família há objectivos a cumprir. O “patter family”, que é o pai da família, tem objectivos. Então ele vai pegar e influenciar para que os filhos cumpram esses princípios porque as famílias são os modelos da sociedade.
“Nas empresas também temos objectivos. Além do salário, há objectivos a cumprir e há resultados a alcançar. Então, precisamos criar instrumentos para que as organizações consigam viver de forma harmoniosa, não retirando os conflitos, porque os conflitos do ponto de vista teórico e pratico, são importantes. Eles ajudam a crescer e a ter outro olhar sobre as coisas. Mas como viver nas organizações com os conflitos? Precisamos de um mediador. E quem é que vai mediar esses conflitos? Nos meus estudos eu apresento “O psicólogo como mediador dos conflitos”.
![](https://www.ecosdohenda.info/wp-content/uploads/2023/04/ALCIDES-CHIVANGU-1.jpg)
Dimensões do livro “O psicólogo como mediador de conflitos nas organizações”
Embora o psicólogo, além de estudar os processos mentais, como as emoções, estudar também os comportamentos, na medida em que o ser humano é um animal político com direitos e deveres numa determinada sociedade, Alcides Chivangu mostra a necessidade de se compreender o homem que está do outro lado, sem descurar a necessidade de estudar os objectivos que ele tem, como por exemplo, aquela cultura organizacional.
“O livro é direccionado para as três dimensões, nomeadamente, a dimensão pessoal. Eu, como individuo, devo saber me integrar nas organizações ou nas empresas. A segunda dimensão é a família, onde o “patter family”, que é o gestor da família deve ser muito equilibrado, tem que ter uma autoridade e uma responsabilidade de levar adiante a família. Principalmente, porque, a primeira empresa é a família. E a terceira dimensão são as organizações institucionais, ou se quisermos, as empresas como tal. O Estado, por sua vez, só cresce se existirem empresas fortes, bem lideradas e que produzem”, sublinha.
Identificar os talentos das pessoas e não as suas deficiências
O autor, que além de docente universitário é consultor em desenvolvimento pessoal e profissional, realça que esse trabalho é uma experiência da sua própria vivência e dos livros que foi lendo ao longo da sua formação académica no ramo da saúde mental e bem-estar. Facto que o levou a trazer uma proposta concreta que é a “psicologia positiva”.
“Eu acredito que a psicologia positiva, essa corrente nova, ela tem como objectivo não trabalhar a doença, mas identificar os talentos nas empresas, promover a felicidade autêntica nas pessoas e identificar as virtudes e forças do carácter das pessoas. Em suma, tirar aquilo que é bom de cada colaborador, de cada pessoa e colocar em prol da sociedade”, garante.
![](https://www.ecosdohenda.info/wp-content/uploads/2023/04/ALCIDES-CHIVANGU.jpg)
Um livro voltado para a reconciliação
Depois de muitos anos a ler sobre organizações, sobre a mente humana, o também Mestre em Psicologia do Trabalho, não tem dúvidas que a sua obra científica, apresentada e autografada, no passado mês de Março de 2023, que pode agregar valor a muitas organizações, as famílias e até mesmo ao próprio Estado.
“Esta obra científica é um elemento que pode contribuir para uma sã convivência entre os angolanos”, sublinha, fazendo menção que na sua obra uma das premissas que apresenta é o facto de o mediador não olhar para quem tem ou deixou de ter razão.
“Trago essa perspectiva na vertente da reconciliação. Os países que hoje vivem saudavelmente tiveram problemas”, aponta, trazendo exemplos concretos como o dos Estados Unidos da América, que tinha conflitos entre o norte e o sul, do Ruanda, por causa das guerras que existiam entre os utus e tutsis e da Africa do Sul onde havia o Apartheid.
“Mas no meu livro, eu também trago, os Estados como uma maneira de reconciliação. Porque se nós analisarmos muito bem, entre nós os angolanos, as guerras que existiram foram entre nós. Entre o MPLA, a UNITA e a FNLA”, aponta, deixando claro que isso não nos levou a lado nenhum.
“O que precisamos não é dar razão ao MPLA, a UNITA ou a FNLA ou ainda criticar quem fez ou deixou de fazer mal. Mas sim, de nos reconciliarmos verdadeiramente. Esse é o papel do psicólogo. Promover uma autêntica reconciliação entre angolanos. Esquecer as nossas quezilas, esquecer os nossos egos e interesses pessoais e colocar os princípios republicanos e servir Angola acima dos interesses pessoais”, esclarece.
Ainda assim, nota com alguma tristeza que, em 2023, no ano em que completamos, 21 anos de paz, ainda há governantes com discursos musculados. Para esse Mestre em Administração de Negócios, líderes como estes, nunca deveriam ser dado espaço para instigar para que uns se sintam marginalizados, outros se sintam vítimas e alguns como os autores da paz.
“Porque a paz em Angola se construiu com todos, tal como acontece nas famílias. O pai vai trabalhar, traz o alimento para casa, mas para esse alimento chegar à mesa vai ter também a participação da mãe. A mãe vai cozinhar, vai limpar e organizar a casa e, apesar de um deles ter trazido o dinheiro, o outro é quem confeccionou e criou as condições para que todos tivessem uma refeição saborosa”, elucida.
Então, na sua perspectiva, fazendo uma analogia ao que apresenta na sua obra, uma organização para ser perfeita cada um tem que ter a sua função e a sua actividade, mas cada um deve trabalhar para o bem da organização, porque só é organização quando tem homens e objectivos.
“E chegados aqui pergunto: Qual é o objectivo de Angola? É vivermos em harmonia e sermos prósperos. Mas não podemos nos esquecer que hão de existir pessoas que têm ideias contrárias, o que é muito bom, porque traz alguns conflitos que são necessários; hão de existir pessoas que vão contrariar os programas do governo, atitudes da família e até as atitudes do pai”, sublinha, deixando claro que, hoje por hoje, nas famílias modernas, há filhos que também questionam esse ou aquele comportamento do pai. E um pai moderno, deve aceitar e ouvir o filho.
“Isso acontece também nas organizações. Talvez, o líder, o chefe ou o Presidente do Conselho de Administração (PCA) dá uma ordem que não se adequa. De forma harmoniosa, um funcionário inteligente pode dizer ao chefe que poderia fazer as coisas de forma diferente. Numa empresa as pessoas também podem ter voz e vez, porque se eu estou numa empresa é porque quero o bem dessa empresa. Caso existirem problemas do fórum criminal ali vão existir outras instituições que vão trabalhar no assunto”.
![](https://www.ecosdohenda.info/wp-content/uploads/2023/04/337269082_745271497037796_2765309697806108552_n.jpg)
O pensamento diferente estimula o desenvolvimento
Sabendo que o psicólogo deve trabalhar com outras instituições do Estado, Alcides Chivangu reforça que deixar de emitir a sua opinião seria um erro e, nunca, jamais existirá unanimidade no pensamento. Pois, sempre que existirem duas ou três pessoas haverá um pensamento diferente, diferenciado e até mesmo contraditório.
“Estava a estudar alguns livros sobre países, e só para se ter uma ideia, há países que formam pessoas para pensar diferente para ver até que ponto as pessoas conseguem gerir as organizações. Porque o que se pede hoje é gestão de conflitos e gestão emocional. Porque se existirem pessoas que pensam diferente, eu como director, vou pensar noutras formas de resolução e aí vai nascer a criatividade e o desenvolvimento”, demonstra apelando aos líderes que é muito bom quando alguém faz crítica do seu trabalho pois, além de ajudar o país a crescer melhora o ambiente das organizações.
“Mas as vezes, o que acontece, é que não estamos preparados para ouvir o diferente. E se nós formos maduros e se estamos numa organização, devemos estar preparados para ouvir, aquilo que queremos e aquilo que não queremos ouvir”, refere.
Em suma, avança o escritor apaixonado em contribuir para a felicidade dos outros, os conflitos e as pressões sempre vão ocorrer e sempre existirão.
“Temos apenas que encontrar sempre uma gestão emocional. Ou melhor, os nossos líderes têm que ter uma inteligência emocional para poderem controlar a raiva, o nervosismo, gerir os medos, e promoverem a confiança”, nota.
Para Alcides Chivangu, o papel de um psicólogo é apresentar à sociedade que as emoções negativas são necessárias porque o ser humano não vive só com emoções positivas, como a alegria, a felicidade e o sorriso que são coisas boas.
“Mas nós também vivemos com a raiva, o medo e a tristeza. Essas emoções negativas hão de acompanhar o homem e os problemas hão de surgir nas organizações. Daí o convite que este trabalho apresenta para trazermos a psicologia positiva no nosso dia a dia. Porque eu duvido que haja angolanos que não queiram o bem de Angola. Queremos todos o bem de Angola, mas podemos perspectivar esse bem de formas diferentes”.
![](https://www.ecosdohenda.info/wp-content/uploads/2023/04/Alcides-Chivangu-3.jpg)
Sem apoio institucional
Em gesto de conclusão, o escritor deixa um recado aos organismos do Estado, no sentido de apoiarem inictaivas como esta, na elaboração de estudos científicos e a escrita de livros com o mesmo cariz cujos frutos, mais cedo ou mais tarde, serão visíveis na sociedade angolana e não apenas aquelas acções que em nada ajudam a moldar o cidadão para as boas práticas.
Alcides Chivangu aponta mesmo o facto de ter solicitado apoio à Vice-presidência da República e outros órgãos públicos e privados que, infelizmente, não se dignaram em apoiar uma obra científica desta dimensão, tendo sido obrigado a desfazer-se do seu meio de transporte pessoal para ter a obra ao dispor da sociedade e dos angolanos. Daí a dimensão do amor ao próximo que o autor nutre em ver estampado no rosto dos angolanos, enquanto seus próximos, a felicidade plena com o que aprenderem ao ler este livro já disponível nas bancas.
Fantástico.
Festas felizes!