Chegou ao fim o ano de 2022. Chegou ao fim, também, a expectativa de vermos mérito na mudança significativa na vida dos que têm menos, durante o primeiro mandato. Com um vergonhoso número de pessoas muito pobres que cresceu, significativamente, nos últimos cinco anos, Angola entra na lista da pobreza com um lamentável record de “15 milhões de pessoas em pobreza extrema”, ou seja, 44% da população vive com apenas 1,90 USD/dia”, de acordo com a FAO, PAM e a WPC. Entre os mais novos, “apenas 1% das crianças dos 0 aos17 anos não é atingida por nenhuma dimensão da pobreza”.
De acordo com o INE/UNICEF, três em cada quatro crianças sofrem privações multidimensionais, que podem variar ente três e sete dimensões na mesma criança. Importa lembrar que as privações se referem às seguintes dimensões: nutrição, saúde, protecção infantil, prevenção da malária, educação, exposição aos meios de comunicação social, habitação, água e saneamento.
Nos últimos cinco anos, assistimos ao mérito do aumento da perseguição aos jornalistas não-alinhados num modelo estalinista. A esse, juntamos a domesticação da imprensa televisiva e, sob o argumento da luta contra a corrupção, passaram a engrossar a tragédia com a multiplicação das TPA”s, onde os conteúdos não reflectem sobre o interesse público e a partidarização cega e de apelo ao ódio é notória. Não esquecendo a novel Girassol que consagrará a cereja em cima do azedo e militante bolo.
O impedimento da legalização de um novo partido político na oposição, sem que o Tribunal Constitucional conseguisse convencer a opinião pública do mérito da sua decisão e ao mesmo tempo esse mérito legaliza dois paraquedistas, um deles foi uma estrela cadente que morreu na praia por falta de eleitores e o outro nem tinha gente suficiente para colocar como suplentes na lista de deputados, mas conseguiu entrar na Assembleia Nacional. A promiscuidade governativa teve o mérito de mostrar, sem necessidade de qualquer desenho, quem é que manda nos Tribunais Superiores deste País, matando de vez a tal independência.
A quantidade de inocentes que morreram e morrem até hoje vítimas da Polícia Nacional, deixando um rasto de órfãos dependentes e abandonados, já se devia ter tornado num Caso de Estudo. Já são tantos os cidadãos anónimos, activistas, zungueiras, o pediatra, jovens nos bairros confundidos com bandidos que um só muro não dará para colocar todos os seus nomes. A esses, juntamos todos os sindicalistas escorraçados e impedidos de continuar de exercer a sua profissão ou de permanecer no seu local habitual de trabalho. A resposta institucional teve o mérito de se tornar, de forma autorizada, ainda mais demolidora quando a festa da democracia foi confundida com uma parada militar com pesado material bélico que gostaríamos de não ter memória pela dor que causaram durante décadas de guerra entre nós. A teoria de “que ninguém é suficientemente pobre para que não possa ser defendido, nem suficientemente rico para que não possa ser acusado” foi um lusco-fusco sem que fosse capaz de cuidar dos mais pobres, protegendo, no entanto, a maioria dos que anteriormente se satisfizeram no banquete da primitiva acumulação de riqueza com o dinheiro público.
Os novos monopólios, que ocuparam os lugares deixados vagos pela destituição da anterior oligarquia, tiveram o mérito de nascer de forma estudada. Uma economia não cresce se não existir livre concorrência. Matar uma telefonia móvel para fazer outra é um dejá vu. Matar uma empresa pública depois de avultados investimentos para privatizá-la a favor de amigos, auxiliares e parentes não augura nada de bom no futuro. A história ainda está a escrever a passagem do anterior para o actual presidente. Mas os mesmos erros estão a ser cometidos, o que significa que as consequências para os actuais protagonistas serão ainda piores que aquelas que estão hoje a ser vividas pelos que estão a contas com a justiça pelos “pecados” de ontem e que vivem no limbo.
O mérito de construir escolas, mas não reconhecer nem a qualidade do professor, nem a situação do aluno tem sido o erro mais grave da Educação. Os cadernos reivindicativos jamais serão um insulto. Eles são legais e decorrem da ausência de mérito para consertar as insuficiências e os abusos contra os professores. A prova da ineficácia da governação na relação com o trabalhador público é provada pelo tom uníssono das greves consecutivas dos enfermeiros, funcionários judiciais, médicos, pilotos e tripulação aeronáutica, professores universitários e do ensino geral, funcionários públicos e, acima de tudo, o mérito da resposta é contrariado pela atitude sempre musculada e adjectivada sem atender às reivindicações que já envelhecem na mesmice.
Na economia, o rosário das lamentações ainda se torna mais preocupante. A diversificação da economia tão “assanhadamente”, presente em todas as campanhas eleitorais, apresenta, desde 2017, uma avaliação negativa, não tendo atingido os domínios da sustentabilidade alimentar, pois a importação continua a ser regra e a fome que não é relativa nunca foi abordada com preocupação. A execução do OGE para os sectores estruturantes nunca é conseguida a 100%, a exemplo da Educação, e o Governo acusa-se a si mesmo por esse fenómeno, quando diz que “a culpa não é do MINFIN, mas, sim, dos ministérios que não executam as despesas cabimentadas” (Jornal Expansão), como se os ministérios não fossem o braço executor do governo.
A contratação pública, que desde 2017 privilegiou, de forma preocupante, o Ajuste Directo que não é transparente na divulgação da despesa e privilegia o nascimento de monopólios que tão fortemente foram criticados na campanha de 2017 pelo candidato vencedor. Só no primeiro semestre de 2022 o valor da “contratação simplificada triplicou e 239 contratos não apresentaram o valor o que viola a Lei dos Contratos Públicos” (Jornal Expansão). Apenas 2 em cada 10 indústrias angolanas possuem Alvará industrial. A pauta aduaneira foi generosa com os bens de luxo e agravou os alimentos e as matérias-primas. O processo de privatização das empresas públicas é opaco. A Reserva Alimentar que tem sido alvo de dotações milionárias consecutivas, não pode ser um negócio semelhante a uma central de compras aliada da importação, comprando abaixo do preço de mercado nacional aniquilando os produtores nacionais. A sustentabilidade tem que ser obrigatoriamente interna pois só assim se multiplicam as empresas agrícolas angolanas. A luta contra a corrupção, a Grande Bandeira da vitória eleitoral em 2017, foi pessoalizada e adquiriu o rosto da vingança não se entendendo o motivo pois os angolanos foram informados em 2017 que “os rostos de TODOS os corruptos eram conhecidos” e que a justiça seria implacável. O resultado final, 5 anos depois, mostrou, que a montanha pariu um rato.

Podíamos escrever uma crónica com 100 páginas para exemplificar o “mérito de piorar o que estava péssimo”. Mas espremendo todos os azedos limões desde 2017, no fim do dia, fica claro, sem necessidade de ter um mestrado: que os angolanos estão mais pobres e vivem menos tempo do que há 4 anos, como prova o IDH de 2021/2022; que o Programa de Combate à Pobreza teve o mérito de multiplicar os pobres; que o índice de criminalidade aumentou dramaticamente; que as medidas de política social têm sido escritas no sentido contrário à resolução dos problemas no que diz respeito à protecção da criança, da mulher, da Educação e da Saúde; que o galopante aumento do custo de vida tornou-se insustentável para a maioria das famílias, mesmo com o aumento de 50% no salário mínimo; que o desemprego é a doença social mais preocupante; que 80% da população desempregada sobrevive graças ao mercado informal. As manifestações continuam a ser combatidas e os seus promotores são detidos por defenderem o país. O país entrou num círculo vicioso e viciado sem vislumbre de ser alterado.
A grande esperança nascida em 2017 esfumou-se perante a incongruência, a falta de sentimento de pertença, a falta de respeito do discurso que criou “médicos do mal” por defenderem melhores condições nos hospitais públicos; que chamou “lúmpen e bandida” à sociedade civil que apenas quer um país para todos sem que a militância defina os privilégios; que trata os Professores como reles empregados desvalorizando o seu papel vital em qualquer sociedade; quando os jornalistas são atacados de forma traiçoeira; quando a criança continua a não ser nenhuma prioridade; quando as autarquias foram olimpicamente ignoradas e sujeitas a uma manobra de diversão com o aumento dos municípios; e quando o saneamento básico, cuja inexistência promove a principal causa de morte por malária nunca foi uma prioridade. A diplomacia económica assente na mão estendida, onde somos o dono do porco e vamos pedir um chouriço, é deprimente, tal como o despropósito do tamanho das delegações presidenciais. Um mandato marcado pela falta de Humanidade, onde o gado e o povo do Sul beberam a mesma água. Este mandato também teve o mérito de tratar sem honra um Presidente que durante 38 anos foi exaltado pelo seu partido como Arquitecto da Paz e saiu com o título de Emérito outorgado pelos seus militantes. A forma macabra como que foi tratado na doença e na morte pelo seu partido, a quem deu tudo, foi assustadoramente reveladora de que nenhum código de honra será respeitado.
A ausência manifesta de uma VISÃO altruísta, que construísse amor pelo próximo e fosse farol da Liderança, bem como a falta de FOCO foram questões decisivas para que a governação se perdesse nos meandros da intriga, nas lutas pelo poder entre o partido, o governo e a nova burguesia institucionalizada. O patriotismo da Liderança é medido pela relação directa da satisfação e felicidade do povo. Nas últimas eleições o povo foi claro no aviso. Mas pelos vistos e lamentavelmente o aviso não foi suficientemente esclarecedor para parar o desnorte já que o ponteiro da bússola não se alterou depois das eleições mostrando um caminho capaz de fazer a diferença.
Fonte: Novo Jornal