A recente detenção de um jovem e a caça de outros dois por, alegadamente, terem produzido um vídeo descrito pelo Serviço de Investigação Criminal (SIC) como sendo “insultuoso e ofensivo” contra a figura Presidente está a suscitar o debate em Angola sobre as limitações à liberdade expressão e de opinião ao abrigo nova lei penal angolana.
O novo Código do Processo Penal determina , no seu artigo 333 que “quem, publicamente, e com intuito de ofender, ultrajar por palavras, imagens, escritos, desenhos ou sons, a República de Angola, o Presidente da República ou qualquer outro órgão de soberania é punido com pena de prisão de 6 meses a 3 anos ou multa de 60 a 360 dias”.
Para o director do Gabinete de Comunicação Institucional e Imprensa do SIC, Manuel Halaiwa, na acção dos jovens estão em causa crimes de ultraje ao Estado, difamação e calúnia contra o Presidente da República e os seus símbolos.
O jornalista, Jorge Eurico disse, à VOA, haver excesso de zelo por parte da polícia sempre que está em causa a figura do Chefe de Estado mas também reconhece que “tem havido um certo abuso por parte dos utilizadores das redes sociais no que tange à liberdade de expressão que, em sua opinião, “acaba por tornar-se em libertinagem”.
“É verdade que o Presidente da República é um símbolo nacional e que deve ser respeitado. Mas também há que ter em conta o princípio da liberdade de expressão para lá da condenação que devemos fazer quando esta liberdade se transforma em libertinagem”, defendeu aquele profissional .
Para o jornalista e investigador, Fernando Guelengue, o artigo 333º da nova Lei Penal angolana “acabou por usurpar o poder da liberdade de expressão no país, protegendo apenas o Presidente da República”.
Guelengue defende que os jovens devem ser ouvidos “porque provavelmente têm alguma prova” das acusações que fazem e sublinhou que a sua detenção “periga a liberdade de pensamento, de expressão e de imprensa”.
Por sua vez, o jornalista Ilídio Manuel, diz que à excepção da acusação de “gatuno” dirigida ao Presidente da República, as críticas feitas pelo jovens não têm nada de ofensivo “a menos que estejam acusados de delitos de opinião”.
“Não estou a ver onde está o crime porque críticas fazem-se todos os dias nas redes sociais. A menos que com esta detenção eles procurem fazer de uma forma preventiva coartar as liberdades de terceiros, o que só existe nas ditaduras”, concluiu.
No vídeo, partilhado na rede social Tik Tok, três jovens trabalhadores de uma empresa chinesa envolvida nas obras do Novo Aeroporto Internacional “Agostinho Neto” que o presidente da República João Lourenço visitou no sábado passado, dizem que vão receber o “nosso gatuno” e criticam o despesismo do Estado.
“Todo dinheiro do Estado está aqui e o povo passa fome”, diz um dos jovens, criticando o facto de alguns trabalhadores das obras ganharem acima de um professor.
“Para quem vem de fora, vê o nosso país e diz Angola já não passa fome”, prossegue, mostrando a moderna infra-estrutura que começou a ser desenvolvida há 25 anos e cujo custo ultrapassava já em 2017 mais de 6 mil milhões de dólares (5,7 mil milhões de euros, ao câmbio actual).
“Tem muita gente a sofrer, muita gente que não come há não sei quantos dias, que não estuda por falta de condições, muitos professores que já não querem dar aulas porque são mal pagos, outros que são corruptos porque o Estado paga mal”, indigna-se.
Aquele responsável sublinhou que “este vídeo viralizou nas redes sociais e provoca danos à imagem do representante de Estado e aos seus símbolos”, sublinhou, reforçando o apelo do SIC aos jovens para que “usem as redes sociais para fins positivos”.
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