Empresa no Dubai, criada para comprar pedras preciosas a baixo preço ao Estado angolano, financia defesa na Holanda da filha do antigo Presidente José Eduardo dos Santos. Advogados portugueses são pagos através de um escritório no Reino Unido usado nesse esquema
Se há uma coisa nos últimos três anos onde Isabel dos Santos não tem poupado é em advogados. Desde que a investigação do Luanda Leaks começou a ser divulgada pelo Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação (ICIJ), no início de 2020, a filha do antigo Presidente angolano José Eduardo dos Santos tem trabalhado com alguns dos melhores escritórios de advocacia nos vários países europeus onde tinha negócios e onde, a partir de então, passou a ter problemas. Dos melhores e também dos mais bem pagos. Mas, com as autoridades em Portugal e na Holanda a terem decidido arrestar contas bancárias, casas e participações em empresas, como é que a mulher antes conhecida como a mais rica de África faz para cobrir essas despesas de defesa?
Novos documentos a que o Expresso e a SIC tiveram acesso, numa investigação feita em parceria com o jornal holandês “NRC”, mostram que pelo menos parte do dinheiro com que Isabel dos Santos tem pago aos advogados vem de uma companhia no Dubai, a Nemesis International DMCC, criada para comprar diamantes a baixo preço ao Estado angolano e revendê-los no mercado internacional.
Isabel dos Santos está a pagar os advogados com dinheiro de uma sociedade do Dubai que faturou milhões com diamantes de Angola.
Uma investigação do Expresso, da SIC e do jornal neerlandês NRC teve acesso a documentos que mostram como a empresária, agora procurada pela Interpol, está a contornar o arresto das suas contas em vários países. Um escritório no Reino Unido, envolvido no esquema, paga também alguns dos advogados de Isabel dos Santos em Portugal, mas todos garantem desconhecer a origem do dinheiro.
O recente mandado de captura internacional pedido por Angola à Interpol é mais um dossier para o batalhão de advogados que Isabel dos Santos tem ao seu serviço em vários países.
Mas com as contas bancárias bloqueadas, as pessoais e as das empresas, a filha do ex-presidente de Angola teve que arranjar uma escapatória para conseguir pagar as despesas da defesa.
Criada há nove anos, a Nemesis é a face visível da Odyssey, uma offshore de Sindika Dokolo, falecido marido de Isabel dos Santos. Por autorização do pai de Isabel, o antigo Presidente de Angola, a Odyssey ficou à cabeça da lista dos clientes preferenciais da Sodiam – a empresa pública de comercialização de diamantes.
Documentos a que a SIC e o Expresso tiveram acesso mostram que, só entre 2016 e 2018, a Nemesis revendeu cerca de 250 quilos de pedras preciosas que tinha comprado a baixo preço.
Quando tomou posse, o novo Governo de João Lourenço afastou a Odyssey da lista de clientes preferenciais e numa providência cautelar de arresto, Isabel dos Santos e o marido foram acusados de ter obtido com os diamantes ganhos superiores a 45%, sem qualquer benefício para o Estado angolano.
É com parte desses lucros que Isabel estará agora a pagar os seus advogados.
Contactados pela SIC e pelo Expresso, Germano Marques da Silva, João Barroso Neto, João Costa Andrade e Marco António Costa alegam sigilo profissional para não responder às questões.
Isabel dos Santos, através da assessoria de imprensa em Portugal, manda apenas dizer que não pode falar sobre o assunto que já está a ser alvo de investigações nos Países Baixos.