Com a derrota nas eleições deste domingo, e a eleição de Lula da Silva como novo presidente do Brasil, Jair Bolsonaro vai deixar de ser o presidente do Brasil a 1 de Janeiro de 2023 e, nesse dia, perderá também a imunidade presidencial de que goza, passado a poder responder a processos judiciais de forma normal.
Segundo a lei brasileira, Bolsonaro só poderia, enquanto presidente, ser alvo e uma investigação criminal com autorização do Supremo Tribunal Federal (STF) do Brasil. Da mesma forma, também só a Procuradoria-Geral da República brasileira poderia denunciar o presidente à Justiça e, para que uma denuncia fosse aceite, teria de ser autorizada pela Câmara dos Deputados. Só depois o presidente poderia ser julgado pelo Supremo, sendo que as consequências de uma eventual condenação seriam a pena correspondente ao crime ou crimes e a perda do mandato.
Actualmente, há quatro processos de investigação autorizados pelo STF nos quais Bolsonaro é alvo, suspeito de diversos crimes. Enfrenta ainda acusações feitas pela Comissão Parlamentar Independente da Covid-19, cujos crimes envolvidos estão em apreciação pela PGR.
Mas, quando deixar a presidência, Bolsonaro passa a ter de responder nestes processos na chamada ‘Justiça Comum’, ou seja, A Polícia Federal pode continuar as diligências de investigação sem autorização do Supremo, os inquéritos na PGR passam para competência das instâncias inferiores do Ministério Público brasileiro, e os processos no Tribunal Superior Eleitoral passam para os respetivos Tribunais Regionais Eleitorais.
Na eventualidade do MP brasileiro avançar com uma pronúncia de Bolsonaro, será julgado por um juiz de primeira instância e deixa de ter direito a ser defendido pelo Advogado-Geral da União: tem de contratar um advogado particular.
Processos de investigação autorizados pelo Supremo Tribunal Federal que já estão a correr:
Divulgação de notícias falsas sobre a vacina contra a Covid-19 (Inquérito 4888)
Este inquérito foi aberto após Bolsonaro ler uma notícia falsa durante uma transmissão ao vivo nas redes sociais, a 21 de Outubro de 2021. A notícia em causa dizia que pessoas vacinadas contra a Covid no Reino Unido estavam a “desenvolver a síndrome da imunodeficiência adquirida (sida)”. Na mesma transmissão, Bolsonaro citou várias notícias falsas para apelar a que a população nau usasse máscaras de proteção. A Polícia Federal brasileira defende que está em causa um crime de incitação pública à prática de crime.
Processo das Fake News (Inquérito 4781)
Em Agosto de 2021, Bolsonaro foi incluído na investigação no processo conhecido como ‘Inquérito das Fake News’, que estava no Supremo brasileiro desde 2019. Em causa está a divulgação de notícias falsas, falsas comunicações de crimes e ameaças a juízes do Supremo, numa investigação que está ligada a outro processo sobre a atuação de milícias digitais para atacar a democracia no Brasil. Bolsonaro passou a ser incluído neste processo depois de, numa transmissão ao vivo nas redes sociais, ter divulgado notícias falsas que questionavam a fiabilidade do processo eleitoral no Brasil. Este inquérito está, para já, sob segredo de justiça.
Divulgação de dados sigilosos sobre ataque ao Tribunal Superior Eleitoral (Inquérito 4878)
Jair Bolsonaro é investigado num processo que corre desde 2021, retirado do inquérito das Fake News. Em causa está a divulgação de dados de uma investigação sigilosa sobre ataques ao Tribunal Superior Eleitoral. Foram divulgados por Bolsonaro e pelo deputado Filipe Barros, com o envolvimento de um delegado da Polícia Federal, Victor Feitosa Campos. O objetivo, segundo o TSE, seria contribuir para a criação de uma narrativa fraudulenta sobre o processo eleitoral no Brasil, “atribuindo-lhe, sem quaisquer provas ou indícios, caráter duvidoso sobre a lisura do sistema de votação”.
Interferência indevida na Polícia Federal (Inquérito 4831)
Esta investigação foi aberta após denúncias do ex-ministro de Bolsonaro, e agora senador eleito, Sergio Moro. Ao sair do governo em 2020, Moro defendeu que o presidente fez várias tentativas de interferir ilegal e indevidamente na atuação da Polícia Federal brasileira.
O caso deverá ser arquivado, já que a PGR considerou não existir provas suficientes contra Bolsonaro para lhe imputar os crimes. Como só a PGR pode denunciar o presidente, o Supremo Tribunal Federal deverá aceitar o pedido. O processo poderá passar para as instâncias mais baixas da Justiça brasileira apenas se não for arquivado até Janeiro.